1988-1994
Eduardo Machado Metello
O terceiro presidente da Famasul foi eleito em 18 de agosto de 1988, depois da disputa entre duas chapas. Com base no processo eleitoral democrático, que é de praxe na entidade, Eduardo Machado Metello assumia a federação com o apoio da diretoria formada por José Armando Cerqueira Amado, como secretário, e Laucídio Pereira da Cunha na função de tesoureiro. Para compor o Conselho Fiscal foram escolhidos Paulino Straliotto, Leôncio de Souza Brito Filho e Aparecido Fernandes. Os Delegados Efetivos da gestão seriam Lúcio Queiroz Moreira e Paulo Césarde Queiroz.
Eduardo Machado Metello foi advogado, professor, escritor, produtor rural e dirigente do Sindicato Rural de Campo Grande e da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul – Acrissul. Durante o período em que esteve à frente da Famasul, conduziu de forma atuante, obtendo destaque nacional ao participar, na companhia de João Nelson Lyrio, da Assembleia Constituinte de 1988. A representação defendia o direito à propriedade privada no Brasil.
Em 27 de agosto de 1988 foi realizada a primeira REAL – Reunião Almoço, que foi criada para promover debates entre produtores rurais e, também, envolver a imprensa nos assuntos mais urgentes da agricultura e da pecuária do estado. O encontro de inauguração do evento teve como palestrante o Dr. Gordon R. Carter, para tratar do tema botulismo1. Outro assunto em pauta na REAL, nesse mesmo dia, foi o esclarecimento à imprensa e à comunidade em geral sobre os rumores do uso de esteroides no rebanho bovino de Mato Grosso do Sul. Na oportunidade, ressaltou-se que a Famasul se posicionava “contra a utilização de qualquer substância que pudesse colocarem risco a saúde pública.”2
Ao longo da gestão de Eduardo Metello, vários encontros da REAL foram promovidos, sempre trazendo os especialistas que pudessem contribuir com debates propositivos e calcados em conhecimentos no setor agropecuário. Dentre eles, podem-se destacar os temas mais relevantes da época, como A invasão da mosca do chifre em MS, Plano Econômico Brasil Novo, Vamos defender nossos produtos?. Dificuldades na Agricultura, O Nelore, O leite, A carne, Exposições Agropecuárias, Plantar bem plantado. Como?, O momento econômico, dentre outros.
O segundo passo para esses encontros aconteceu no dia 28 de abril de 1990, com a Reunião Almoço com a Imprensa – REALIM. O mote daquela edição foi A importância da comunicação social no setor rural e contou com as palestras do publicitário Ariosto Barbiere, do apresentador do programa A Hora do Fazendeiro na Rádio Educação Rural, Ciro Nascimento, e do editor de economia do Jornal Correio do Estado, Maurício Hugo. A relação harmoniosa da Famasul com os veículos de comunicação sul-mato-grossenses foi relatada por Roberto Chamorro, um dos assessores de imprensa que passaram pela entidade. Conforme o jornalista, “o bom diálogo com a imprensa possibilita a difusão de informações de interesse da classe rural.”3
O ano de 1989 não foi fácil para a agricultura em decorrência das eleições que elegeram Fernando Collor de Mello como Presidente da República. O país estava agitado frente ao novo cenário político, deixando o setor agrícola em segundo plano. Em virtude do novo panorama que se anunciava, o movimento Levante Nacional da Soja surgiu em diversos estados brasileiros, com o propósito de chamar a atenção do poder público para a situação agrícola, em especial da soja.
À época, Eduardo Metello declarou4 que o cultivo da soja não era compreendido pelo governo, que acreditava que o grão era destinado somente à exportação, sem considerar o óleo utilizado na mesa do brasileiro, nem mesmo as indústrias importantes do setor e o aproveitamento das terras ociosas. Nesse ínterim, a Famasul participou do movimento em nível estadual e nacional, que culminou com uma grande marcha de agricultores até Brasília na busca de visibilidade e respostas às reivindicações do setor.
O desrespeito à lei gera
descrédito no nosso estado e
prejudica os verdadeiros
trabalhadores rurais selecionados
para futuros assentamentos
Em 14 de fevereiro de 1989, a Famasul enviou um telex ao então Governador de Mato Grosso do Sul, Marcelo Miranda Soares, informando sobre a situação da Fazenda Itassul, no município de Itaquiraí. O documento5 sinalizava que os ruralistas estavam “apreensivos pela maneira aparatosa e organizada como foi feita a invasão das terras, parecendo verdadeira operação de guerra”. Em nome da entidade, Eduardo Metello pediu providências para o restabelecimento da ordem e a abertura de inquérito para a apuração de responsabilidades dos sem-terra. “O desrespeito à lei gera descrédito no nosso estado e prejudica os verdadeiros trabalhadores rurais selecionados para futuros assentamentos”.
Três meses depois, em 19 de maio de 1989, foi publicado no Diário Oficial da União um decreto que determinava a Fazenda Itassul como de “interesse social para fins de reforma agrária”6. No mesmo ano, em 18 de setembro, o Presidente da República, José Sarney, também autorizou o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra a desapropriar a Fazenda Sumatra, localizada no município de Bodoquena, para atuar no processo de avaliação e divisão de terras.
Ao longo de 1989, o Famasul foi convidada pelo Incra para participar de diversas reuniões para tratar das iniciativas de assentamento em Mato Grosso do Sul. Uma delas reuniu 250 famílias que seriam destinadas ao Projeto Casa Verde, do município de Nova Andradina; e a outra para o Assentamento Monjolinho, situado em Anastácio, que teria a presença de 350 famílias. A federação também foi convidada a participar do sorteio e da entrega definitiva de 60 parcelas aos pequenos trabalhadores rurais do Projeto de Assentamento Campo Verde, no município de Terenos, e da comemoração do primeiro ano de implantação do Núcleo Urbano do Projeto de Assentamento Novo Horizonte, localizado na cidade de Ivinhema, sul do estado.
A Frente Ampla da Agropecuária levou à Brasília, em maio de 1989, diversas proposições da classe produtora. Eduardo Metello esteve presente no encontro realizado na sede CNA, onde representou a Famasul. Dentre as demandas, estavam em evidência a imediata liberação do crédito de comercialização e custeio, a atualização do preço mínimo do açúcar, cana, trigo, arroz e outros produtos, e o realinhamento do dólar, já que política cambial da época, além de não refletir a realidade, vinha trazendo altos prejuízos ao setor exportador da agropecuária.
Uma das ações mais marcantes do primeiro triênio da gestão de Eduardo Metello foi a promoção do Leilão Famasul 10 anos, realizado em 22 de maio de 1989, no Parque de Exposições Laucídio Coelho, com a organização de Eduardo Metello, Sylvio Mendes Amado, Carlos Dias de Andrade e membros da diretoria da entidade. O evento foi tão importante que contou com o aporte, inclusive, de grandes empresas como Perkal Automóveis, Matossul Fiat, Allflex International do Brasil e Leiloinvest, além das emissoras de televisão TV Morena, TV Manchete e TV Campo Grande, que contribuíram com a cobertura jornalística do evento.
Contando com o apoio da Acrissul, da União Democrática Ruralista – Regional de Campo Grande e Secap – Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento do estado de Mato Grosso do Sul, o leilão visava alavancar as finanças da Famasul para, assim, dar prosseguimento aos projetos futuros. Tal evento contou com a participação maciça da classe produtora, chegando a quase 50 doadores diretos, que disponibilizaram cerca de mil animais para serem leiloados, entre garrotes, novilhas, touros, vacas leiteiras e até ampolas para inseminação artificial.
Em novembro de 1989, a Famasul cobrou os deputados estaduais de Mato Grosso do Sul acerca da morosidade no atendimento ao crédito para o custeio agrícola e alertou para a gravidade da situação, que prejudicava aqueles que trabalhavam para produzir alimentos. Os produtores ficaram indignados com a situação: “Na hora da super safra, as glórias são do Governo. No momento das super dificuldades, o agricultor é que tem que se virar.”7
A cada ano a Famasul se tornava mais requisitada para participar de eventos importantes, seja em Campo Grande, seja em outras capitais brasileiras. Um deles foi em abril de 1989, quando o Cônsul Geral do Canadá, Normand Villeneuve, convidou Eduardo Metello para falar no 2o Seminário Brasil-Canadá Gado de Corte, ocorrido na Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso do Sul – Fiems.
No final do mesmo ano, outros três eventos reforçaram a representatividade da federação: O / Simpósio sobre Marketing Rural, promovido pelo Sindicato das Agências de Propaganda de MS, a reunião de fundação e posse da Diretoria da Associação de Jovens Agricultores do Brasil – JA e a palestra Uma Postura Conjunta Brasil-Argentina no Comércio Internacional de Carne e Grãos, realizada pela Sociedade Rural Brasileira e o Instituto Cultural Brasil – Argentina de São Paulo.
Em 1990, o Brasil passava por grandes mudanças nas esferas política e econômica. Em março daquele ano, a Famasul emitiu uma carta8 ao então Presidente da República, Fernando Collor de Mello, na qual o parabenizava pelo Plano Brasil Novo e, ao mesmo tempo, ponderava sobre a necessidade urgente de estender ao produtor rural, pessoa física, os benefícios da conversão dos Cruzados congelados em Cruzeiros, para atender folha de pagamento dos empregados e não haver perda da safra pendente. Solicitaram, ainda, a abertura imediata da carteira rural para que a atividade agrícola não fosse interrompida, prejudicando o abastecimento de alimentos para a população.
Em sequência, foram expedidos ofícios ao Presidente do Banco Central, Ibrahim Éris, ao Ministro Interino da Agricultura, Bernardo Cabral, e à Ministra da Economia, Zélia Cardoso de Mello, solicitando a liberação da verba retida aos sindicatos rurais patronais. Os documentos9 demonstravam a preocupação da Famasul com a situação da Agricultura, advertindo às autoridades de que, se não fossem alocados recursos imediatos, a colheita correría o risco de se perder, resultando numa queda de produção de alimentos em Mato Grosso do Sul.
Uma das dificuldades de 1990 foi o foco de febre aftosa nos municípios de Coxim e Amambai. A Famasul recebeu do Diretor de Operações da Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal – lagro Ernest Shillings Filho, a relação das propriedades que seriam interditadas para que as providências fossem tomadas e, assim, sanar o problema. Em 1991, o Secretário de Estado de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Agrário de Mato Grosso do Sul, José Américo Flores do Amaral, indicou o nome de José Armando Amado, então secretário, para representar a Famasul no Conselho Deliberativo de Febre Aftosa, contribuindo de forma significativa para reduziros impactos da doença na região.
No mesmo ono, outro situação atípica movimentou os produtores sul-mato- grossenses. Diversos pontos de abastecimento começaram a se negar a vender combustível em tambores e galões, fundamental para o funcionamento das fazendas e, ademais, às vésperas da colheita. A Famasul expediu um telex10 ao Ministro da Agricultura, Antônio Cabrera Mano Filho, e ao Presidente da CNA, Antônio Ernesto de Salvo, relatando a gravidade do fato.
A insatisfação foi retransmitida ao Conselho Nacional de Petróleo, já que a prática prejudicava principalmente os pequenos e médios agricultores. Após a reivindicação feita às autoridades, o Ministério comunicou11 ao Sindicato do Comércio Varejista e Derivados do Petróleo do estado de MS que “os revendedores de postos de abastecimento não só podem, como devem, atender as vendas de diesel em galões e tambores”.
Os revendedores de postos de
abastecimento não só podem,
como devem, atender as vendas
de diesel em galões e tambores
Um momento marcante e histórico para a Famasul foi a participação ativa no processo de integração dos países do Mercado Comum do Sul – Mercosul, em 1992, convidando-os a debater sobre os avanços da implantação do Tratado de Assunção, que criou o bloco econômico, no V Fórum Nacional Permanente de Consultas do Mercosul, no setor de Política Agrícola do Ministério da Agricultura.
Dada a importância crescente do Mercosul no cenário político brasileiro, a Famasul esteve presente, representada por Dácio Queiroz Silva, nas reuniões do Fórum Permanente de Consultas do Mercosul, realizada em Brasília (DF). Tal atuação foi bastante relevante, considerando que as entidades e organizações de Mato Grosso do Sul necessitavam de espaços para debater sobre as implicações do bloco nas cadeias produtivas de carne bovina, algodão, arroz, soja e milho.
Outro marco na história do setor agropecuário brasileiro foi, sem dúvida, a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – Senar. A Famasul acompanhou de perto o Projeto de Lei n° 125/90, aprovado em 10 de outubro de 1991 na Comissão de Assuntos Sociais do Senado. “O Senar hoje é nosso, estruturado com dinheiro nosso, voltado para as necessidades da aprendizagem rural no Estado”12, comemorou Eduardo Metello. A partir daí, outros benefícios começaram a chegar para o homem do campo, como a inauguração da telefonia fixa rural em Mato Grosso do Sul, a qual o presidente da Telecomunicações de Mato Grosso do Sul – Telems, Silvio Lopes de Araújo, convidou a Famasul para participar da solenidade, em 1992.
No final de 1993, a Famasul fez investimentos em sua estrutura física, com a aquisição de um veículo novo, computadores e telefones. Foi feita também a remodelação do prédio para a construção de um refeitório. O próximo passo seria firmar uma parceria com o Governo do Estado para a cedência de um terreno para a construção de uma sede maior, que abrigaria também o Senar/MS nas novas instalações. Seria um passo essencial para a integração e o trabalho conjunto das duas entidades.
Eduardo Machado Metello contribuiu de diversas maneiras para o desenvolvimento da Famasul e desde o seu início, quando cedeu o espaço do seu escritório para abrigar a entidade em seus primeiros anos de atividade, sempre ao lado de Sylvio Mendes Amado, em uma parceria de trabalho e ideal. Metello recebeu a honraria de Personalidade Econômica Marcante do comendador Jean Vejan do Instituto Brasileiro de Comércio Exterior- Ibracex pelo destaque e méritos em sua atuação em benefício da sociedade. Foi também indicado para ocupara vice-presidência da CNA, para a Câmara Setorial de Bovinocultura de Corte do Ministério da Agricultura e Reforma Agrária e para a Comissão de Pecuária de Corte da CNA.
No ano de 1993, o desenvolvimento positivo do Senar/MS foi um dos motivos para comemorar. A instituição implantada no estado gerava os primeiros frutos, sendo apontada como uma das “melhores do Brasil”. Os cursos se realizavam em ritmo progressivo, assim como os seminários promovidos periodicamente na sede da Famasul. No mesmo período, o Centro de Educação Rural de Aquidauana – CERA passou a ser administrado pela Famasul em convênio com o Governo do estado de Mato Grosso do Sul, que fez cessão de uso pelo tempo de 20 anos.
O Famasul em Revista, publicação lançada na gestão de Eduardo Metello, tornou- se uma referência na divulgação da entidade, tanto da federação, quanto do Senar/MS. O espaço trazia assuntos de interesse da classe agropecuária, tornando- se um canal de denúncias e reivindicações dos produtores rurais sul-mato- grossenses. Era um veículo de comunicação especializada que servia de fonte valiosa de informação para todos que desejavam conhecer e, também, estarem atualizados sobre os temas que eram tendência no setor.
Enquanto estava à frente da Famasul, Metello reformulou o Estatuto Social da federação e deu suporte para a criação de dez sindicatos rurais em Mato Grosso do Sul durante os dois triênios de sua gestão, sendo que seis foram criados em 1989: Sete Quedas, Bataguassu, Mundo Novo, Arai Moreira, Chapadão do Sul e Dois Irmãos do Buriti; dois em 1990: Eldorado e Caracol; um em 1992: Santa Rita do Pardo e um em 1993: Nova Andradina. Eduardo Machado Metello dizia que a federação era “a principal responsável pela proteção dos interesses da classe produtora e, por isso, deveria caminhar unida com os sindicatos rurais e demais entidades de classe em torno dos objetivos comuns da agropecuária”.15
Na carta16 que redigiu aos produtores quando entregou a presidência da federação, Eduardo Metello comentou sobre as dificuldades enfrentadas pelo setor rural durante os seis anos de sua gestão, especialmente no que dizia respeito a pouca valorização da classe no contexto social e político brasileiro, “como se a população não precisasse de alimentos” e, muitas vezes com os trabalhadores relegados ao esquecimento e à omissão do poder público.
No entanto, Metello ressaltou que tal cenário tornava “o sindicalismo mais forte e atuante” para as lutas que enfrenta cotidianamente. Na carta de despedida da presidência, o pecuarista evidenciou essa capacidade de articulação da classe com a menção ao “Congresso Brasileiro de Dirigentes Rurais”, que reuniu em Brasília em 1994,1.500 líderes produtores na CNA, trazendo entusiasmo aos que puderam participarão encontro.
Um ponto crucial debatido no Congresso, e levantado na carta de Eduardo Metello, tratou da necessidade de “condenar a violência no campo, inclusive a decorrente de invasão de propriedades, em desrespeito à lei, numa deturpação da reforma agrária, que deve ser feita de maneira ordeira e sensata, visando à incorporação ao processo produtivo das terras ociosas”.
Metello também salientou “a firme decisão da classe produtora em apoiar com vigor o combate à inflação”, que corroía a economia brasileira. Após deixar a presidência da Famasul, Eduardo Metello passou a exercer a função de Delegado Representante da federação frente à CNA, onde continuou “a lutar pelo campo e pelo produtor rural.”
As características da personalidade de Eduardo Metello como líder ruralista e defensor das vivências do homem do campo também foram sensivelmente visíveis em seu legado literário. Escreveu Meu Amigo Autonomista (1994), biografia de Leonardo Correia da Silva, A Reforma Agrária Brasileira (1998) e 3 Casos (1994), além de publicações em jornais e revistas especializadas. Por seu trabalho como escritor, ocupou a cadeira n° 32 da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, cujo patrono é WeimarTorres, vaga deixada pelo memorável poeta Aldo de Queirós.
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